quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Síntese do texto “Capoeira e Educação Popular”, de Anselmo da Silva Accurso.

Desde os tempos primitivos, o homem está engajado numa constante evolução de suas técnicas e no desenvolvimento de suas culturas variadas, seus costumes, seu crescimento pessoal e de seu grupo. De acordo com o que nos fala Paulo Freire, é fundamental, para o seu crescimento interior, que o homem se perceba enquanto ser inacabado e imperfeito, capaz de adquirir aprendizagens e “somar” (internalizar) valores culturais que o permitam avançar na sua concepção de mundo.
Cada sociedade constrói, em seu meio, a sua história e se desenvolve à sua maneira, através das descobertas e dos domínios de técnicas de trabalho e/ou de organização social. Ainda, os valores culturais aprendidos por integrantes mais velhos da mesma comunidade são internalizados de forma automática pelos membros mais novos, de forma que essa cultura não morre e se recria (ou se renova), desenvolvendo-se e evoluindo. Essa evolução compreendida como auto-descoberta permite que comunidades distintas atinjam, em tempos também diferentes, graus de desenvolvimento mais elevados. Esse fator, de acordo com as mudanças políticas e econômicas ocorridas, acaba por abrir espaço para as dominações de uns povos sobre os outros. O que funcionava dentro de uma economia de subsistência (plantar e colher apenas o necessário para a sobrevivência do grupo), acaba sendo substituído por uma economia embasada nas trocas de produtos na qual o excesso da produção passa a ser moeda de troca e, dessa forma, quanto mais se produz, mais se conquista. Na “necessidade” de aumento da produção, o homem acaba entrando numa corrida incessante de acúmulo de riquezas, o que fortalece o ideal de dominação de um povo sobre o outro, com vistas na necessidade de aumento da mão-de-obra para a maior produção. É nesse processo que os dominados acabam perdendo sua identidade e deixando de “fazer cultura” (p. 129). Seguindo na linguagem do autor,
“Um povo sob o domínio de outro simplesmente deixa de ser sujeito de sua vida, passando a objeto de outros interesses. O povo dominado se desestrutura, já não opina, não entendendo o processo a que foi submetido. Do homem dominado é pervertido o curso de sua história, fazendo-o não compreender o novo mundo a que foi submetido. (...) Sua mutação de sujeito em objeto impede-o de atuar, dando lugar a um ser frustrado, perdendo seu engajamento na construção de sua liberdade. (...) Assume a cultura do dominante e a ideologia da dominação” (p. 129)
Paulo Freire, inúmeras vezes lembrado pelo autor do texto, reafirma o processo de dominação dos europeus (Portugueses e Espanhóis) sobre o povo latino-americano. Fala sobre a possibilidade de usarmos termos como “sociedades-sujeito”, para aquelas agentes de sua própria história (muitas vezes são as dominadoras), e “sociedades-objeto”, para aquelas que sofreram e/ou sofrem com a dominação de outras sociedades e que vivem, por vezes de forma passiva, um processo de adesão de uma ideologia e de uma cultura que não lhes cabe, perdendo suas raízes e sua própria identidade.
De um processo de dominação de uns povos sobre os outros nasceram as escolas, previstas inicialmente para catequizar os subalternos para as regras da dominação, entregando-lhes uma cultura nova, novos valores morais e éticos e etc. As escolas, ainda hoje, costumam repetir os erros adquiridos nos tempos de quando criada, se tornando alienante ao disfarçar/evitar a realidade histórica contundente e espantadora de nosso país, necessária para o entendimento de nossa sociedade como um todo e para o resgate de nossas raízes, de nossa identidade cultural. Accurso, de maneira impecável, diz que o professor de nossa sociedade, de um modo geral, “não se compromete em revelar a história, preferindo a comodidade de ver um mundo de conveniências” (p.133). Toda essa negação à verdade motivada pelo comodismo dos profissionais da área, aliada a uma desvinculação dos conteúdos a serem ensinados com a realidade dos alunos, acaba afetando a educação como um todo de modo bastante prejudicial.
A proposta à qual este texto se refere – Educação Popular -, visa uma transformação na área da educação e, por conseqüência, na sociedade. A Educação Popular se baseia, de forma direta, numa relação próxima entre os aprendizes e os conteúdos a serem aprendidos, ou seja, numa engajada busca da aprendizagem sobre as temáticas que englobam e afetam a sociedade local (o contexto social). Faz-se necessária uma busca incessante pelo entendimento da realidade social para que se torne possível a percepção da importância de mudá-la para melhor. Isso não significa a negação dos saberes acadêmicos, mas sim, o entendimento da interdependência entre o saber formal (científico) e o saber popular.
Para o autor do texto, propositor da capoeira como ferramenta de Educação Popular, esta luta/cultura de resistência muito pode contribuir para que se atinjam patamares de uma educação mais ampla e verdadeira que descubra a realidade para as pessoas e que possibilite a transformação social. Para ele, “é possível relacionar as épocas, desde o colonialismo ao capitalismo, fazendo com que o praticante da capoeira se situe em seu espaço temporal, descobrindo as verdadeiras raízes do povo brasileiro, daqueles que construíram as bases econômicas deste País.” (p. 140).
Ao final, Accurso faz uma breve crítica à transformação da capoeira em um produto que pode ser consumido. De um modo geral, o texto tenta salientar a importância da capoeira como ferramenta educativa para o resgate da identidade cultural de nosso País. Ainda, busca alertar os educadores da atualidade para uma tomada de consciência frente às problemáticas referentes às relações sociais entre as classes: dominantes e dominados. Como agente transformador da sociedade, o professor não pode (e por mais que consiga não o conseguirá ser) ser neutro em suas atitudes. Para finalizar esta síntese, um trecho do autor que convoca os profissionais da educação para uma reflexão profunda e interessante:
“É imprescindível que tanto o professor de sala de aula quanto o trabalhador social façam uma opção chave. Uma alternativa é que sua ação seja para manter a sociedade atual, ou melhor, adestrar o homem para um desempenho de conformismo; outra, é buscar a transformação da sociedade através do homem inconformado. Não existe neutralidade. Aquele que se diz neutro se resigna a objeto da história. Decorrência da primeira alternativa é sua ação entediadora na sala de aula e assistencialista no trato com as comunidades.” (p. 137).


Referências Bibliográficas:
· ACCURSO, Anselmo da Silva. Capoeira – Um instrumento de Educação Popular. Produção Independente.

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