segunda-feira, 19 de maio de 2008

SER PROFESSOR

(Jefferson Castro)
Muitos são os problemas enfrentados pelos profissionais da educação na atualidade: a falta de tempo, a necessidade de compreender e acatar os anseios de seus alunos, o volume de informações circulantes nos diversos tipos midiáticos, determinada inversão da lógica da autoridade dentro da sala de aula, os baixos salários e até mesmo uma certa desconfiança depositada na educação. Esses são apenas alguns fatores que têm levado educadores de todas as áreas a uma profunda e constante reflexão sobre a situação educacional de nosso país. Além disso, a educação como área fundamental para o desenvolvimento sócio-político de um povo traz em si uma responsabilidade gigantesca que, muitas vezes, acaba por assustar os futuros educadores.

Mais do que nunca, ao que me parece, o campo da educação exige profissionais capacitados, extremamente ligados à prática que lhes cabe e coerentes, em suas atitudes, com o discurso que apresentam ao corpo de alunos. Ainda, a intensa vivência na posição de mediador do processo ensino-aprendizagem requer atitude, envolvimento e paixão, para além, é claro, do profundo conhecimento e respeito à todas as diferentes áreas. Entenda-se atitude como a real tomada de consciência do papel do educador que, ao meu ver, vai muito além do ensino de conteúdos e da preparação para o mercado de trabalho. Educar consiste em provocar, instigar e se dedicar junto com os educandos (envolvimento e paixão), tendo em vista a busca por melhoras nos níveis sociais e políticos de uma comunidade. Assim, a educação passa a ter um magnífico poder de transformação da realidade de cada educando e se constitui em valor potente para a vida, diferentemente de uma simples preparação para uma prova de vestibular. Essa atitude por mim referida está para Paulo Freire e Ira Shor como sendo a capacidade necessária que os professores têm de pesquisar, re-conhecer e re-criar os conhecimentos previamente desenvolvidos por cientistas e pesquisadores. Dessa forma, a escola é sim um espaço de pesquisa, de busca e de re-criação, deixando de lado o idealismo capitalista da simples obtenção do conhecimento.

Obviamente, nem tudo é tão simples nesse ciclo interminável da educação. Um trabalho eficiente exige políticas corretas de um sistema educativo que, no Brasil, por exemplo, é um tanto falho e parece um pouco duro, enrijecido. Ainda que se tenham profissionais capacitados, precisa-se de condição de trabalho (incentivo à educação continuada), flexibilidade curricular e motivação/interesse por parte do grupo de alunos, fator este que tem provocado enorme sofrimento e frustração em profissionais recém-formados e que apontam as dificuldades que surgem frente às mudanças por uma melhora educacional. Muitos pais, por exemplo, ainda acreditam que as mudanças no campo da educação são incompetentes e acabam por repassar a perigosa idéia de que o autoritarismo e a repetição - centrais em paradigmas tradicionais de educação – são as formas mais eficazes para se garantir a aprendizagem (e este é apenas algum exemplo que aponta a dificuldade da sociedade em aceitar as transformações nesse campo). A falta de motivação dos alunos (e também do professor) destacada anteriormente é reversível de acordo com a compreensão de Freire que nos mostra a motivação como parte do processo de aprendizagem e não anterior à ela, como costumamos vê-la. Ele ainda revela que esta é “uma forma muito antidialética de entender a motivação”(p.15, 1986). De acordo com ele, “a motivação faz parte da ação.(...) você se motiva à medida que está atuando, e não antes de atuar.” (p.15, 1986)

Ser educador é, portanto, temer sem tremer. Ele deve estar preparado para enfrentar inúmeras dificuldades em sua prática que se estendem desde a aceitação de metodologias diferenciadas até o curto espaço de tempo para se atingir objetivos como a eficiente aprendizagem de uma massiva quantidade de conteúdos. Ser professor consiste em perceber as dificuldades e ser incansável na luta pela superação destas. É, ainda, perceber-se como agente político e com potencial de reversão e re-criação das realidades que o atormentam. É nossa tarefa liderar e saber nos portarmos como líder, estabelecendo relações horizontais e crendo sempre no diálogo como fator de aproximação entre idéias divergentes. Paulo Freire nos diz no texto O sonho do professor sobre a Educação libertadora que “o diálogo pertence à natureza do ser humano, enquanto ser de comunicação. O diálogo sela o ato de aprender, que nunca é individual, embora tenha uma dimensão individual.”(p. 14, 1986)

Numa perspectiva mais animadora e não menos verdadeira, ser educador é carregar em si a incrível missão de transformar, sempre que possível para melhor, a realidade social que o circunda. Além disso, a área da educação nos permite vivências múltiplas e únicas, em sua natureza, de aprendizagem constante, de apreensão de realidades distintas, de verificação de mundos e ideologias que se chocam, muitas vezes entre si, e/ou se complementam e se completam. Para um professor de séries iniciais, por exemplo, é significativa a mágica do processo de construção da capacidade de leitura do mundo através da alfabetização. No campo da Educação Física, minha área, mora a necessária compreensão dos benefícios que os diferentes exercícios físicos orientados e as práticas desportivas podem trazer para a manutenção da saúde mental e corporal humana. Assim, como nos diria Rubem Alves, ser um Educador é “ser um fundador de mundos, um mediador de esperanças, um pastor de projetos”. É como lapidar diamantes brutos, trabalhar a cerâmica e moldar uma linda peça.

Nossa tarefa maior é construir e manter um ambiente no qual nossos alunos possam vivenciar, experimentar, perceber a realidade, para uma posterior reflexão, criando assim a possibilidade de apropriação dos sentimentos envolvidos na tarefa, fatores que fortalecem o processo de aprendizagem. Educar é permitir o contato com a realidade com a intenção única de senti-la, percebendo os seus problemas e seus benefícios na totalidade. O profissional da educação precisa estar preparado para explorar o mundo que o cerca e, ainda, incentivar e fazer o convite aos seus alunos para a busca do entendimento das coisas desse mundo, sem o compromisso pronto de encontrar respostas para as perguntas, mas sim, com a idéia fixa de descobrir. A curiosidade faz parte da natureza humana e, juntamente com a vontade de aprender, constitui um fator disparador para a aprendizagem.

Enfim, ser educador é crer sempre na possibilidade de mudança, é fazer e esperar pela melhora. É nunca desistir de correr atrás de sonhos que pairam ao longe num horizonte chamado utopia.É ser profissional sempre, sem folga, mas com a recompensa inigualável de, além de lidar com o que se gosta, participar do processual e fantástico desenvolvimento humano. O educador acredita sempre no potencial do ser e, para tal, não precisa de provas além de sua própria crença. Finalizando, ser educador é sonhar, ainda que acordado, que um mundo melhor é possível e que, para isso, falta muito pouco. É seguir sempre em frente, construindo um futuro no qual a felicidade seja mais possível, tal como no pensamento de Eduardo Galeano (http://www.pensador.info/autor/Eduardo_Galeano/):
"A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar."


Referências Bibliográficas:
SHOR, Ira e FREIRE, Paulo. Medo e Ousadia – O cotidiano do Professor. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1986.
Websites:
Frases de Eduardo Galeano, em http://www.pensador.info/autor/Eduardo_Galeano/, acessado em 21/04/2008.
WebSite que traz a vida de Rubem Alves e frases do autor: http://www.releituras.com/rubemalves_bio.asp, acessado em 21/04/2008:

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